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- maio 18, 2020
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STF suspende art. 29 da Medida Provisória n. 927/2020 e qual a implicação nas relações de trabalho?
No dia 29/04/2020 o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria de votos, suspender o artigo 29 da MP 927, o qual previa que os casos de COVID-19 não seriam considerados ocupacionais, salvo comprovação do nexo causal.
A redação do citado art. 29 visava deixar claro que a contaminação pelo coronavírus não deveria ser considerada doença decorrente do trabalho, como regra, mas somente se ficasse comprovado o nexo causal.
Por exemplo, empregados que trabalham em hospitais (médicos, enfermeiros) que sejam contaminados pelo COVID-19 podem ter a doença reconhecida como moléstia ocupacional, por se enquadrarem na exceção prevista na Medida Provisória, ou seja, por não ser difícil comprovar o nexo causal.
A decisão do STF foi fundamentada no argumento de que o art. 29 da MP 927 da forma como foi publicado viola direitos trabalhistas ao deixar de tratar como doença ocupacional a contaminação pelo coronavírus, salvo de houver comprovação do nexo causal, em um momento em que há notória exposição ao vírus por trabalhadores que atuam diretamente em combate à pandemia do COVID-19 e, por exigir do trabalhador o ônus quanto à prova de ser a doença ocupacional, o que vai de encontro com o que determina a Constituição Federal em relação à redução de riscos inerentes ao trabalho.
Com essa decisão, o STF considerou a contaminação pelo COVID-19 no ambiente de trabalho como doença ocupacional e que goza de presunção de nexo causal com o trabalho exercido, cabendo ao empregador afastar o referido nexo de causalidade.
Via de consequência, o empregador poderá vir a ser responsabilizado pelo empregado que eventualmente seja contaminado pelo coronavírus, a exemplo, do trabalhador doméstico que poderá promover ação judicial contra o seu empregador a fim de que este seja declarado responsável pela contaminação do vírus, sendo categorizado como acidente de trabalho, podendo o empregador, inclusive, vir a sofrer uma condenação com o ressarcimento de despesas médicas e hospitalares, FGTS, dano moral e pensão civil.
Contudo, o fato do STF ter suspendido liminarmente o artigo 29 da MP 927 não pode permitir a presunção de que todos os casos de contaminação pelo coronavírus sejam considerados ocupacionais.
Na atual situação, é possível dizer que há nexo causal presumido, como dito, por exemplo, com relação aos médicos e enfermeiros que trabalham em contato direto com pacientes infectados. Contudo, diferente é o caso de um contador ou outro profissional que esteja trabalhando em home office.
Se por um lado foi acertada a decisão do STF ao retirar do empregado o ônus da prova com relação à contaminação do coronavírus, por ser uma prova praticamente impossível de ser produzida, haja vista, que nem mesmo os médicos e especialistas da área sabem ao certo como o vírus de propaga, por outro lado e com base na mesma lógica, não se afigura justo imputar ao empregador esse mesmo ônus.
É sabido que a contaminação do Covid-19 pode acontecer em casa, no deslocamento residência x trabalho e vice-versa, em estabelecimentos comerciais relacionados ou não às atividades essenciais e também no trabalho.
Mas com a decisão do STF, caberá ao empregador, em eventual discussão judicial ou administrativa, demonstrar que tomou todos os cuidados para preservar a saúde de seus empregados quando, possível, permitiu o trabalho em home office, as escalas de trabalho, rodízio de profissionais, orientação e fiscalização sobre adoção de medidas relacionadas à saúde e segurança, como higienização, entrega de equipamentos de proteção individual (EPI’s) etc.
Entretanto, o desdobramento dessa decisão do STF vai além do que podemos pensar e da mera obrigação de o empregador ter de emitir a CAT e o empregado passar a ter direito à estabilidade no emprego após a alta médica prevista no art. 118, da lei 8213/91.
Por exemplo, lembrando que a MP 905/2019 foi revogada e, com isso, o acidente de trajeto voltou a ser considerado acidente de trabalho, será possível o empregado afirmar que tenha sido contaminado pelo coronavírus no trajeto de sua residência para o trabalhou ou vice versa e vir a ser afastado por doença ocupacional? Diante da incerteza com relação a forma e local em que se deu a contaminação, seria essa situação justa e razoável?
Da mesma forma que o STF decidiu retirar do empregado o ônus da prova com relação ao nexo causal, não nos parece justo que o empregador seja responsabilizado pela contaminação pelo coronavírus de seu empregado especialmente durante o estado de calamidade pública que estamos enfrentando e por não ser possível ter a certeza de quando e onde a contaminação efetivamente se deu.
Portanto, importante muita cautela ao analisar a situação concreta, a fim de que fique caracterizada a responsabilidade do empregador apenas em casos que o nexo causal seja evidente e com isso evitar possíveis danos e prejuízos oriundos da interpretação literal da decisão do STF.
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Melissa Noronha M. de Souza Calabró é titular no escritório Melissa Noronha Advogados.
Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e em Coaching Jurídico, com formação em Professional & Self Coaching pelo IBC.
É membro efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/SP.
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